Marcas do passado

É com alguma dor que recordo o passado, mas hoje finalmente o consigo encarar.

Tive uma infância infeliz, marcada por diversos episódios de violência doméstica. O meu pai, um homem extremamente violento, trancava-me no quarto às escuras e batia-me com um cinto, até se cansar. Acusava-me de ser a culpada pelo abandono da minha mãe.

Ele esquecia-se é que também eu sentia a fuga dela, que se tivesse dependido de mim, ela ainda hoje estaria connosco. Era uma simples rapariga adolescente, que tinha medo de revelar os horrores por que passava. Só que na escola os professores começavam a notar a minha falta de atenção, as marcas no meu corpo, as constantes olheiras de noites mal dormidas e passadas a chorar.

Um dia, a minha directora de turma confrontou-me e não consegui esconder a situação. Estava desesperada e não aguentava mais. Fui entregue a uma família que me aceitou de imediato e sempre me deu muito amor. Eles são para mim os meus verdadeiros pais, pois foram eles que me fizeram saber o que era amor.

Devo-lhes tudo o que tenho. Mas foi duro conseguir ultrapassar as marcas do passado, principalmente porque criei uma enorme fobia de estar em espaços fechados e sem luz. Mas eles protegiam-me, até que não o conseguiram fazer.

Quando fui para a faculdade vivia com uma colega. Um dia ela não estava em casa e uma tempestade cortou-me a luz. Desesperada saltei da janela para a rua. Poderia não ter acontecido nada, mas só que foi uma queda de quatro andares. Arrisquei a minha vida e jurei pedir ajuda.

Os meus pais apoiaram-me com o tratamento. O melhor de tudo é que além de ter controlado a minha fobia de espaços e escuridão, aprendi a conhecer-me e a valorizar-me. Criei bases que me faltavam para uma vida equilibrada e feliz.

Obrigada por acreditarem e por me fazerem acreditar em mim…