Vida contabilizada
Sou uma jovem que sofre de Transtorno Obsessivo Compulsivo.
Acreditem que viver com esta doença não tem sido nada fácil e tem me limitado a vida.
Já na infância surgiram os primeiros sinais. Era uma maníaca das limpezas e da arrumação. Tinha que estar tudo imaculado e no seu devido lugar. Depois comecei a ganhar rituais de repetição. Contava as peças de roupa inúmeras vezes, só acendia a televisão depois de contar até 50, para me deitar tinha que bater com os pés 10 vezes, verificava o despertador 12 vezes, rezava seis vezes por noite, batia com a almofada 8 vezes... enfim, tudo era contabilizado na minha vida, até situações básicas como ir à casa de banho.
Na escola tentava disfarçar estes meus rituais, mas os meus colegas acabavam por se aperceber e afastavam-se de mim, gozando comigo e com as minhas "pancadas", que era como chamavam a estes meus rituais. Relações de amizade e amorosas não conseguia ter.
Fazia tudo sozinha, tal como ir ao cinema, às compras, à ginástica, mas até fazer isto me cansava, porque tudo implicava rituais específicos. A verdade é que estava constantemente esgotada, porque a minha cabeça não parava de pensar um segundo que fosse. A altura mais tranquila era quando adormecia, o que também só acontecia à base de medicamentos.
Com 20 anos já parecia uma pessoa de idade, tal não era o desgaste mental. Por mais que tentasse controlar a situação não conseguia. Os meus pais já não sabiam o que fazer. Andei em psicólogos e psiquiatras, mas de nada adiantou. Já só me restava mais uma tentativa de tratamento para o meu transtorno obsessivo compulsivo, que era ir para a clínica.
Como já me sentia sem forças, entrei cheia de ânimo. Foi muito difícil, principalmente a adaptação, porque partilhar o espaço com inúmeras pessoas, sendo a maioria desorganizada, tirava-me do "sério". Comecei a focar a minha atenção noutras coisas.
Tanto a equipa terapêutica como os pacientes foram incansáveis comigo. Cada mês ia destruindo um ritual, sem que o substituísse. No fim, os meus traços de TOC eram minimos e mais controlados. Hoje já é raro o momento em que ainda recorro a um ritual e mal sinto que vou vacilar, ligo a pedir ajuda.
Consegui arranjar trabalho e namorado. Ele sabe do meu passado e ajuda-me. O certo é que aprendi a viver sem ter que usar "muletas" e pela primeira vez estou a perceber e a sentir o que é ser feliz.